A gigantesca manifestação pela defesa do mandato da presidente Dilma Rousseff, em São Paulo, nesta sexta-feira (13), deixou dois sinais bem claros ao governo: a esquerda reagirá a uma tentativa de golpe, mas quer reformas estruturantes, revisão nas medidas de ajuste fiscal e política econômica com foco no social.
“Acabou a
eleição”, comemorou o presidente da Central Única dos Trabalhadores
(CUT), Vagner Freitas, ao definir que as manifestações sepultam as
pretensões dos conservadores pelo “terceiro turno” das
eleições representado pela tentativa de impeachment. Segundo ele, os
trabalhadores estão organizados, unidos em torno de uma pauta por mudanças na
economia e defenderão a democracia contra os intolerantes. “Eles que
esperem a próxima eleição”, cutucou.
“Vou levar pessoalmente
à presidente Dilma dois recados: os trabalhadores disseram aos
golpistas que não há espaço para impeachment e querem alteração nas
Medidas Provisórias do ajuste fiscal”, disse o deputado Vicente Paulo da
Silva, o Vicentinho (PT-SP), ao final da manifestação que começou em frente ao
prédio da Petrobras, na Avenida Paulista, e foi encerrada abaixo de chuva na
Praça da República. Ex-presidente da CUT, Vicentinho acha que em São Paulo
o público que resistiu às fortes chuvas para defender o mandato de
Dilma superou as expectativas - 12 mil nas contas da PM, 100 mil
nas estimativas da CUT ou 41 mil nos cálculos do Datafolha.
As palavras de ordem “mexeu com
Dilma, mexeu comigo” e “A Paulista é nossa”, repetidas ao longo do trajeto
entre a Avenida Paulista e Praça da República nesta sexta-feira,
indicam que a esquerda, finalmente, mostrou a cara e não sairá das
ruas. As entidades querem agora estender a onda de manifestações a
Brasília.
“Estamos construindo uma frente
de esquerda, com a participação do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto),
para unificar uma nova jornada na primeira semana de abril. Vamos cercar o
Congresso”, anunciou Gilmar Mauro, coordenador nacional do Movimento dos
Trabalhadores Sem Terra (MST).
Ele diz que a esquerda pressionará Senado
e Câmara por mudanças na legislação, mas dirá também que em função da falta de
representatividade do atual Congresso, a reforma política deve ser feita por
uma Constituinte exclusiva e soberana. Mauro não acredita que o impeachment
esteja na ordem do dia, mas afirma que a esquerda vai agir de acordo com os
fatos, sem precipitações.
“O impeachment não está posto”,
observou o militante do MST, lembrando que os mesmos movimentos que hoje gritam
nas ruas por reformas saberão agir caso surjam ameaças à democracia. “Nós
também queremos punição para os criminosos que desviaram dinheiro da
Petrobras”, disse, com um alerta aos parlamentares que eventualmente conspirem
pela quebra da ordem democrática. “Não brinquem com o sentimento do povo.
A democracia custou muito cara”, alertou. “Custou suor, sangue e mortes”,
acrescentou o deputado Vicentinho.
Outro dirigente do MST, João
Paulo Rodrigues, afirma que o ato marca o início de uma longa jornada em defesa
de mudanças e das regras democráticas que reelegeram Dilma. “Não
somos como cavalo paraguaio (que só tem arrancada). O MST não blefa.
Estamos nas ruas e vamos continuar com mais força ainda. Em vez de pedir
impeachment, a direita deveria investir para ganhar as eleições de 2016 e
tentar evitar a volta do Lula em 2018”, alfinetou o dirigente.
“A esquerda estava indo
para a morte no desfiladeiro como manada e ninguém estava
reagindo. A direita está armando um golpe e nós dando milho aos
pombos. Pelo menos reagimos”,celebrou o ex-deputado Adriano
Diogo (PT), presidente da Comissão Estadual da Verdade, que lembrou o
simbolismo da manifestação desta sexta-feira: foi nessa mesma data, em 1964,
que o ex-presidente João Goulart, pressionado pela esquerda, fez o célebre
discurso da Central do Brasil, no Rio de Janeiro, onde anunciou que faria
as reformas de base que provocaram a reação que o derrubou".
“A semelhança com o clima
que antecedeu o golpe de 1964 é total”, disse Diogo,
um ex-preso político, comparando os grupos que pregam o impeachment
aos mesmos golpistas que exigiam a renúncia de Jango ou a intervenção militar
que, sacramentada entre a noite de 31 de março e 1º de abril, levou o País
a 21 anos de ditadura.
Esperado, o ex-presidente Luiz
Inácio Lula da Silva não apareceu. Segundo a CUT, Lula não havia prometido
participar, embora um dos dirigentes tenha avaliado que diante da repercussão
do discurso feito há duas semanas, no Rio, ele tenha decidido agir com mais
cautela para se preservar. Nos bastidores, Lula tem passado o recado
aos sindicalistas que a luta pela defesa do mandato de Dilma e do legado
será longa, o que significa que neste momento ele não precisa estar em todos os
atos.
Os dirigentes das principais
entidades envolvidas na manifestação fizeram questão de frisar que estão indo
às ruas para defender a Petrobras, a reforma política e a democracia,
mas também para sinalizar ao governo que não aceitam o ajuste fiscal que, em
nome do superávit primário, está penalizando trabalhadores. Wagner Freitas
disse que a CUT vai encaminhar ao governo uma proposta com sugestões de
mudanças para que o País volte a crescer. “Chega do receituário que para a
economia”, disse.
“O Brasil
vai acordar a partir de hoje. A presidente Dilma tem o direito constitucional
de ficar. Um golpe contra ela é um golpe contra o trabalhador. Mas queremos uma
agenda positiva”, afirmou o presidente da Central dos Trabalhadores
do Brasil (CTB), Adilson Araújo.