Enquanto a
Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda que no máximo
15% dos partos sejam
cesarianas, no Brasil o índice é de
52%, chegando a
88% na rede privada. Os dados estão na pesquisa inédita
Nascer no Brasil: Inquérito Nacional sobre Parto e Nascimento, feita pela Fundação
Oswaldo Cruz e o
Ministério da Saúde, divulgada nesta quinta-feira (29).
A pesquisa acompanhou o pré-natal e o parto de
23.894 mulheres
em maternidades públicas, privadas e mistas em 191 municípios em todos
os estados. A coleta de dados ocorreu de fevereiro de 2011 a outubro de
2012. Para a coordenadora da pesquisa,
Maria do Carmo Leal, os resultados são alarmantes, já que a intervenção cirúrgica expõe a mãe e o bebê a riscos desnecessários.
“Um prejuízo que a criança pode ter é ela nascer antes do tempo que
estaria pronta para nascer e, portanto, pode ter dificuldade para
respirar, pode precisar ir para uma Unidade de Tratamento Intensivo(
UTI)
neonatal, e isso é um imenso prejuízo no começo da vida, essa separação
da mãe. Para a mãe, o primeiro risco é que a cesárea é uma cirurgia, e
como tal tem maior chance de hemorragia, de infecção, e também a
recuperação da mulher é pior na cesárea do que no parto vaginal”,
comparou.
No Brasil, 28% das mulheres começam o pré-natal querendo a cesárea,
enquanto a média mundial é de 10%. O dado preocupa a pesquisadora, que
defende uma mudança na cultura do parto no país.
“Tem uma cultura na sociedade, muitas mulheres hoje realmente já acham
que a cesárea é uma boa forma de ter parto. E para os médicos também, é
conveniente para eles que a cesárea aconteça porque organiza a vida
deles, marca uma atrás da outra e não fica à disposição do tempo que
você não controla, que é o tempo de nascimento de cada criança. É
verdade que médicos podem induzir a mulher a fazer a cesárea, mas o
sistema está todo organizado de uma forma a promover isso”.
Segundo Maria do Carmo, nos países desenvolvidos que também vinham
aumentando as taxas de cesárea, os índices começaram a diminuir por
causa das evidências científicas de riscos para a mulher e para o bebê
na gestação em questão e também nas seguintes. Para ela, governo e
sociedade precisam se mobilizar para reverter o quadro.
Com o tema "A mãe sabe parir e o bebê sabe como e quando nascer", o
estudo também mostra que, mesmo nos partos normais, o atendimento não
atende às boas práticas recomendadas pela OMS, o que provoca dor e
sofrimento desnecessário. Entre as práticas comuns estão a de deixar a
mulher em trabalho de parto apenas no leito, sem estímulo para caminhar e
sem alimentação durante o período, a de oferecer remédios para acelerar
as contrações e a de deixar as mulheres darem à luz deitadas, de
costas.
Saúde Pública
Os dados ainda apontam que, no Brasil, entre as mães de baixo risco,
apenas 19,8% tiveram presença contínua de acompanhante, 25,6% puderam se
alimentar,
46,3% foram estimuladas a se movimentar e
28%
tiveram acesso a procedimentos não farmacológicos para alívio da dor.
Apenas 5% dos partos ocorre sem intervenções, enquanto no Reino Unido o
número chega a 40%.
Quanto aos cuidados com o bebê, entre os recém-nascidos saudáveis,
apenas 28,2% tiveram contato pele a pele com a mãe após o nascimento,
16,1% receberam o seio na sala de parto e 44% mamaram na primeira hora.
O alojamento conjunto foi verificado em 69% dos casos. As intervenções
nos bebês também são altas: 71% tiveram as vias aéreas superiores
aspiradas, 39,5% passaram por aspiração gástrica, 8,8% foram para o
inalador e 8,7% para a incubadora.
Das mulheres ouvidas para o levantamento, cerca de 30% não desejaram a
gravidez, 2,3% tentaram interromper a gestação e 60% iniciaram o
pré-natal tardiamente, após a 12ª semana. Do total de mulheres, 19% eram
adolescentes, sendo que 42% delas fizeram cesárea, e, com isso,
“estarão expostas a mais riscos nas gestações futuras”, segundo o
estudo.